quinta-feira, 12 de abril de 2012

Multidão

Ana Lu: DA LICENÇA POR FAVOR! Andei ouvindo umas coisas, e não era coisa boa não. Era coisa que não se diz assim, em qualquer lugar, à qualquer pessoa... Por isso fiquei séria, por isso estou séria hoje. Um burburinho. Ouví barulho de chuva, de cheiro de chuva, e sonhei que a janela estava aberta. Mofo, borrão, gesso e cal. A pressão nos olhos é tão grande que já não enxergo, e caio. Caio da Varanda em cima de alguém. porque a minha cabeça pesa mais que os meus braços e as minhas pernas e talvez toda a extensão do meu tronco e quando eu afundo assim desta maneira nas mãos eu sinto a matéria dos meus pensamentos com uma textura esfumaçada cinza dilatada seca morta-viva opaca vazia tão cheia de pó como se fosse um daqueles livros que ficavam guardados atrás do vidro naquele quarto que eu podia regular a luz pra ler enquanto você dormia e mesmo assim, controlar a luz não era uma metonímia para mais nada, porque eu não podia reger a velocidade que o sangue corria nas minhas veias e porque você acordava assustada à noite com as minha crises de epilepsia, e eu babava, cuspia sangue pelos olhos, e urinava em nós duas, e ao mesmo tempo em que você tinha medo, você esperava que dessa vez eu morresse e você pudesse sair rastejando daquele quarto, porque você era covarde demais pra me deixar ali, na meia luz, no meio do livro, no meio da vida, no meio da vontade, no meio de nós duas uma montanha enorme cheia de vacas brancas pastando, um riacho de água cristalinas e uma caverna cheia de estalactites que se arremessavam contra e gente, porque você fechava os olhos e torcia para que uma atravessasse a sua cabeça, e eu achando que você era forte demais para aceitar ser fraca e na verdade você era fraca tão fraca só fraca que desmorava com uma dor de cabeça e isso sim eu achava que era uma metonímia, porque todo mundo é sintoma de crise e nessas noites, você não sabe o que eu vi no inferno,  não sabe do vazio, do escuro, das deformações, dos gumes, dos gritos, do babel, do sal, do gosto do cinza azedo confortável, da sua saliva, você não sabe do medo engolidor de facas, nem da loucura, nem de morrer e continuar vivendo e depois disso as duas táo ausente de nós, e do dia em que você engoliu dois, três ou quatro remédios e numa força inerte de 3.000 newtons acendeu a luz no máximo e, foi quando parei de ter cuidado para que as palavras não rasgassem a nossa pele.

e continuo

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